terça-feira, 22 de outubro de 2013

Estou cansada...

“Brinco com a minha tristeza como quem cuida de uma amiga fiel…” Rubem Alves
Foto: Arnaldo J. G. Torres

Quando me perguntam como estou, a única coisa que consigo dizer é: "Estou cansada". Meu corpo resmunga e minha alma grita! Não são gritos de socorro e desespero, agora gritos de braveza, coragem, força e raiva... Sim raiva!

Eu tive forças o suficiente para combater as dores e não permiti que o sofrimento se alojasse aqui… Agora eu me sinto cansada e com raiva disso tudo! Eu fui capaz de me colocar em pé na linha de frente da batalha e guerrilhei com todas as armas que encontrei. Eu vi meu existir ameaçado, senti meu corpo sucumbir, suportei dores e incômodos, resiste bravamente e pouco resmunguei, não fraquejei e pouco chorei.

Pois agora que a batalha foi vencida, eu transbordo em lágrimas e desabo, sei que não serei mais atacada, acabaram as sessões de quimioterapia e radioterapia, e por isso meu corpo agora se lança no chão. E se for preciso aqui ficarei até reencontrar minhas forças!

Recebi alta médica, mas sinceramente ainda não sinto alegria… Sinto um cansaço na alma. Fui bombardeada por todos os lados, meu corpo está despedaçado. Não creio que repentinamente eu tenha ficado pessimista, e tão pouco me falte gratidão. Mas vejo que agora tenho uma visão realista do que vivi. Fico tentando mensurar o peso que carreguei, não sei… Mas sei que foi pesado e por questão de sobrevivência, não fraquejei! Essa resistência garantiu minha sobrevivência. Eu poderia ter desistido, e se quer ter lutado.

Mas eu lutei, e agora… Permitam-me por favor que eu chore! Deixe-me gritar, resmungar, xingar e até duvidar de Deus... Eu não posso aceitar com sorrisos de gratidão todas as dores que senti, seria uma atitude apática. Em algum momento eu precisaria questionar... Por que ameaçar a minha existência!? Logo a minha? Sinto que foi essa inquietação, que silenciosamente me gerou forças para lutar a favor da vida. Pois eu NÃO aceitei a condição imposta, eu NÃO me deixei ser vencida.

Estou entrando nos meus cantos, desapertando os nós, abrindo as comportas, me descobrindo, me reconhecendo, me aceitando e me libertando... Chorando e gritando, estou descobrindo o que restou... E talvez do que tenha restado, seja na verdade o que realmente Sou. 

E foi por tudo isso que escrevi, que me ausentei do blog… Fiquei exaurida com as sessões de radioterapia, é literalmente um bombardeio… Me senti e ainda me sinto confusa com a possibilidade de ter que retomar a vida… Não sei nem por onde começar… Parece que não restaram forças para recomeçar…

O sofrimento regado pela esperança, é o que dá sentido as lágrimas que escorrem pelo meu rosto neste momento, é sentindo essa dor que eu penso em coisas que de outra forma eu não pensaria. É parte de um processo para se criar um futuro novo. E como bem diz Rubem Alves, é como o sofrimento das dores de um parto que vêm pela alegria de se saber que uma criança vai nascer. 

Neste momento quero como companhia as palavras de Rubem Alves, Bernhard Wosien, Fernando Pessoa, a música de Ravel, Vivaldi, Bach, a vivacidade das flores, o canto dos pássaros, a leveza das águas, o calor da chama… E o movimento... Quero o movimento do ar entrando e saindo do meu corpo, do sangue circulando em minhas veias, do pulsar do coração… Quero apenas sentir o movimento da vida que existe em mim!


RTZB

"A Morte me informa sobre o que realmente importa… Não, não é nada mórbido. É que não temos opções. A vida é aquilo que fazemos com a nossa Morte. Ou a olhamos de frente e ela se torna amiga, ou fazemos de conta que ela não bate à porta, e ela entra noturna, pela porta da cozinha, para nos ir comendo em silêncio... Ás vezes ela chega perto demais, o susto é infinito, e até deixa no corpo marcas de sua passagem. Mas se tivermos coragem para a olharmos de frente é certo que ficaremos sábios e a vida ganhará simplicidade e a beleza de um haikai.”  Rubem Alves
Foto: Arnaldo J. G. Torres